Será que o mundo é como imaginamos?
Por Djair Galvão*
A mais recente exposição do premiado fotógrafo brasileiro
Sebastião Salgado tem méritos que superam a beleza plástica das imagens.
“Genesis” reúne 245 fotografias dos quatro cantos do mundo com o propósito de
ensinar algo simples e direto: o mundo não é, necessariamente, do jeito que
imaginamos.
Quem mora nas grandes metrópoles é tentado a pensar o
universo humano em conglomerados habitacionais, ruas e avenidas largas, cheias
de carros, centros comerciais, prédios, casas, luzes, cores e muita gente
circulando por todos os lugares. O nascer e o pôr do sol são ditados por esse
ritmo.
Salgado prova que não é bem assim: uma família mora em uma
casa no alto de uma árvore na África, um habitante do Ártico desliza suavemente
em seu trenó puxado por renas – sem pegar congestionamento algum – e um caçador
de aves em Papua-Nova Guiné exibe sua caça para as lentes do brasileiro sem se
preocupar com o que pensam os defensores dos animais noutras partes do globo.
Noutro momento, somos transportados para geleiras magníficas ou ficamos diante
de iguanas gigantes de Galápagos, de jacarés do Pantanal e de leopardos do
Quênia. Leões-Marinhos, indianos, habitantes da Sibéria, ariranhas, albatrozes
e suas asas gigantes e a manada de elefantes enfeitam este cenário rico deste
“outro mundo”.
É tanta beleza que parece não caber no olhar. A diversidade
de rostos, lugares, tipos, ambientes inóspitos (para pessoas como nós)
multiplica as possibilidades. Em dado momento você é tentado a pensar que tudo
parece um filme. E não deixa de ser. É um conjunto de imagens, de gentes e de
coisas, mas é a realidade. A realidade de boa parte dos bilhões de moradores do
nosso planeta.
Em cartaz em São Paulo no Sesc Belenzinho, a exposição é uma
aula foto a foto. Mostra que estamos pouco preparados para olhar para os
outros. Olhar sem julgar. Sem querer que os outros sejam como gostaríamos ou
como imaginamos. O que dizer dos índios do Xingu em seus trajes de cerimônia
religiosa ou da mãe que carrega suas três crianças em um campo da Namíbia sem
se preocupar com o que eu penso, faço ou deixo de pensar em São Paulo? Eles não
sabem que eu existo, certamente nunca saberão e nem posaram para Salgado
pensando nisso. Simplesmente se deixaram registrar porque confiaram no modo
como ele os vê. Como eles realmente são.
O pai, a mãe, o professor ou a professora que quiser
explicar aos pequenos (ou para os já crescidinhos) o que é diversidade, basta levá-los
a estes universos eternizados nesta mostra. As imagens ensinam mais do que
palavras, engolem qualquer discurso moralizador e encantam porque são reais. Lá
não existem pessoas posando e nem lugares previamente preparados para as fotos.
Mesmo que fosse assim, a mensagem não mudaria o principal: nosso olhar precisa
ser “retreinado”. Nossas cabeças estão muito restritas a um cotidiano que nos
aprisiona e nos torna tão pequenos diante de um mundo tão vasto e belo.
Esta é a moral desta fábula de imagens, de preto e branco,
luzes e beleza: o mundo é tão diverso que não temos o direito de resumi-lo a
uma visão mesquinha e pobre como a que construímos nesta nossa parte do mundo.
Quem olhar detidamente as imagens captadas por Sebastião Salgado em “Genesis” vai
pensar duas vezes antes de alimentar preconceitos tão idiotas quanto pensar que
é o centro do universo.
* Jornalista, professor e escritor, autor de “O Saci de Duas
Pernas” (Eureca Produções, 3ª edição).
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